Conjuntura Internacional
1. Um desafio se coloca ao PSOL: a ressignificação do socialismo.
Quase todos os partidos brasileiros estão adaptados ao sistema e defendem o
Capital como único dínamo das relações econômicas – ainda que pelo menos oito
dos 31 constituídos tragam o socialismo em seu nome ou programa.
2. O socialismo que queremos reinventar não nos coloca como
‘passadistas’. Sabemos que não há socialismo sem desenvolvimento das forças
produtivas. E urge qualificar o tipo de desenvolvimento – não apenas econômico,
mas também de justiça social, democracia política, equilíbrio ambiental e
oportunidade cultural, centrado no respeito aos ritmos e limites da natureza e
comprometido com a superação das desigualdades sociais – que defendemos.
3. Não há mais paradigmas de sociedades socialistas. É preciso
aposentar os dogmas e colocar os mitos dos grandes revolucionários e das
organizações políticas do século XX no seu (mas não pouco importante) lugar de
memória emuladora na nossa atuação contemporânea: bons companheiros de viagens
que não servem como ‘guias geniais’, ‘faróis luminosos do porvir’. Não
começamos do zero. A história traz ensinamentos e parâmetros que não podem ser
descartados, sob o risco de repetirmos erros.
4. Não há mais modelos. A China, com seu capitalismo de Estado,
fascina os gerentes do Banco Mundial com sua centralização, monolitismo e
exploração de mais valia, que enfrentou mais de mil greves operárias nos
últimos dois anos. Diferentemente, em Cuba, há o envolvimento de seu povo na
defesa da soberania e das conquistas da heroica e cinquentenária revolução,
ameaçadas pelo criminoso boicote econômico imposto pelos EUA, o que nos leva a
manifestar nossa solidariedade a inegáveis conquistas sociais do povo cubano e
às reformas ora implementadas.
5. Não há modelos mas há experiências novidadeiras e interessantes
em nuestra América, notadamente na Bolívia, Venezuela e Equador. Ali se
verificam avanços graças à combinação de mobilização popular com ocupação de
espaços institucionais e reformas constitucionais plebiscitárias. O chamado
‘processo bolivariano’, muito virtuoso ao abrir novos horizontes para as
esquerdas latino-americanas, sobretudo na luta anti-imperialista; todavia, não
está imune a equívocos, retrocessos e personalismos.
6. Momento crítico, nebuloso, contra-hegemônico. Mas também
promissor para as esquerdas, apesar de tudo. O pulso ainda pulsa, e é para que
nos indaguemos sobre alguns ‘valores’ inquestionáveis de um século atrás, como
ditadura do proletariado e partido único. Nossa alternativa socialista deve ter
presentes questões como a desalienação do trabalho, autonomia da sociedade
civil em relação ao Estado, diversidade cultural, combate às opressões de
gênero, orientação sexual, étnica, racial etc. A cabeça ainda pensa, e é para
que discutamos, como Marx bem o fez, as mutações do capitalismo. Enquanto não
há massa crítica e organizada para a socialização dos grandes meios de
produção, que conquistemos, ao menos, a socialização dos meios de governar.
Esta, efetivada, resulta em situações de confronto com os interesses do grande
Capital e em redução da exploração econômica.
7. Como reiterava nosso admirável companheiro Carlos Nelson
Coutinho, vivemos tempos de ‘reformismo revolucionário’, de flexibilidade
tática que não comprometa a firmeza estratégica, de luta por reformas concretas
e horizontalização de direitos civis, compreensíveis para as maiorias
marginalizadas. Reformas e direitos que questionam o próprio sistema,
estruturalmente reacionário e regressista.
Das primaveras aos outonos
8. Caminhantes no deserto, saudamos o oásis que representou a
chamada ‘Primavera Árabe’. Mas esses processos, dinâmicos e contraditórios, têm
produzido, em muitos casos, o retorno de governos autoritários e até de corte
fundamentalista, que têm que enfrentar protestos populares. Os interesses do
imperialismo também estão ali, sempre atentos ao que melhor assegura os ganhos
do grande capital. Situações contraditórias em que regimes autoritários locais
sofrem crescente oposição, também de segmentos apoiados por forças
imperialistas que desejam retomar o controle sobre regiões ricas em petróleo,
com o povo na miséria.
9. Os movimentos do “Ocupa”, que causaram surpresa e aumentaram
nosso ânimo em 2011/2012, constituem interessante reação ao comodismo
consumista e ao egoísmo social, mas perdem alguma força, talvez em função de
sua própria perspectiva sem direção política e sem projeto de poder.
10. A velha receita da superação da crise capitalista –
precarização de direitos, arrocho salarial e demissões – tem incendiado a
Europa. As manifestações massivas têm caráter reativo à privatização do sistema
de saúde e se soma à atuação dos jovens, que amargam o maior desemprego da
história ibérica nas últimas décadas, mas isso não se traduziu nas urnas. O
povo grego continua sua admirável luta, mas as medidas recessivas e
espoliativas preconizadas pelo Banco Central Europeu têm sido implementadas, a
ferro e fogo. Por outro lado, não podemos fechar os olhos à ascensão fascista,
especialmente expressiva na Grécia.
11. O Movimento Cinco Estrelas, de Beppe Grillo, na Itália,
expressão da antipolítica, recebeu forte votação dos que, como nós, repudiam o
sistema. Mas seu desdobramento é uma incógnita e revela muitas contradições. A
crise é tão grande e generalizada que chegou ao Vaticano, com o primeiro Papa
renunciante em quase seis séculos, denunciando a ‘hipocrisia religiosa’,
revelando a profunda degradação das estruturas do poder eclesiástico, que
interage com os poderes seculares.
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