terça-feira, 18 de fevereiro de 2014

Conjuntura Internacional - Resolução aprovada no 4º Congresso Nacional do PSOL

Resolução aprovada no 4º Congresso Nacional do PSOL
   
Conjuntura Internacional

1. Um desafio se coloca ao PSOL: a ressignificação do socialismo. Quase todos os partidos brasileiros estão adaptados ao sistema e defendem o Capital como único dínamo das relações econômicas – ainda que pelo menos oito dos 31 constituídos tragam o socialismo em seu nome ou programa.

2. O socialismo que queremos reinventar não nos coloca como ‘passadistas’. Sabemos que não há socialismo sem desenvolvimento das forças produtivas. E urge qualificar o tipo de desenvolvimento – não apenas econômico, mas também de justiça social, democracia política, equilíbrio ambiental e oportunidade cultural, centrado no respeito aos ritmos e limites da natureza e comprometido com a superação das desigualdades sociais – que defendemos.

3. Não há mais paradigmas de sociedades socialistas. É preciso aposentar os dogmas e colocar os mitos dos grandes revolucionários e das organizações políticas do século XX no seu (mas não pouco importante) lugar de memória emuladora na nossa atuação contemporânea: bons companheiros de viagens que não servem como ‘guias geniais’, ‘faróis luminosos do porvir’. Não começamos do zero. A história traz ensinamentos e parâmetros que não podem ser descartados, sob o risco de repetirmos erros.

4. Não há mais modelos. A China, com seu capitalismo de Estado, fascina os gerentes do Banco Mundial com sua centralização, monolitismo e exploração de mais valia, que enfrentou mais de mil greves operárias nos últimos dois anos. Diferentemente, em Cuba, há o envolvimento de seu povo na defesa da soberania e das conquistas da heroica e cinquentenária revolução, ameaçadas pelo criminoso boicote econômico imposto pelos EUA, o que nos leva a manifestar nossa solidariedade a inegáveis conquistas sociais do povo cubano e às reformas ora implementadas.

5. Não há modelos mas há experiências novidadeiras e interessantes em nuestra América, notadamente na Bolívia, Venezuela e Equador. Ali se verificam avanços graças à combinação de mobilização popular com ocupação de espaços institucionais e reformas constitucionais plebiscitárias. O chamado ‘processo bolivariano’, muito virtuoso ao abrir novos horizontes para as esquerdas latino-americanas, sobretudo na luta anti-imperialista; todavia, não está imune a equívocos, retrocessos e personalismos.

6. Momento crítico, nebuloso, contra-hegemônico. Mas também promissor para as esquerdas, apesar de tudo. O pulso ainda pulsa, e é para que nos indaguemos sobre alguns ‘valores’ inquestionáveis de um século atrás, como ditadura do proletariado e partido único. Nossa alternativa socialista deve ter presentes questões como a desalienação do trabalho, autonomia da sociedade civil em relação ao Estado, diversidade cultural, combate às opressões de gênero, orientação sexual, étnica, racial etc. A cabeça ainda pensa, e é para que discutamos, como Marx bem o fez, as mutações do capitalismo. Enquanto não há massa crítica e organizada para a socialização dos grandes meios de produção, que conquistemos, ao menos, a socialização dos meios de governar. Esta, efetivada, resulta em situações de confronto com os interesses do grande Capital e em redução da exploração econômica.

7. Como reiterava nosso admirável companheiro Carlos Nelson Coutinho, vivemos tempos de ‘reformismo revolucionário’, de flexibilidade tática que não comprometa a firmeza estratégica, de luta por reformas concretas e horizontalização de direitos civis, compreensíveis para as maiorias marginalizadas. Reformas e direitos que questionam o próprio sistema, estruturalmente reacionário e regressista.

Das primaveras aos outonos

8. Caminhantes no deserto, saudamos o oásis que representou a chamada ‘Primavera Árabe’. Mas esses processos, dinâmicos e contraditórios, têm produzido, em muitos casos, o retorno de governos autoritários e até de corte fundamentalista, que têm que enfrentar protestos populares. Os interesses do imperialismo também estão ali, sempre atentos ao que melhor assegura os ganhos do grande capital. Situações contraditórias em que regimes autoritários locais sofrem crescente oposição, também de segmentos apoiados por forças imperialistas que desejam retomar o controle sobre regiões ricas em petróleo, com o povo na miséria.

9. Os movimentos do “Ocupa”, que causaram surpresa e aumentaram nosso ânimo em 2011/2012, constituem interessante reação ao comodismo consumista e ao egoísmo social, mas perdem alguma força, talvez em função de sua própria perspectiva sem direção política e sem projeto de poder.

10. A velha receita da superação da crise capitalista – precarização de direitos, arrocho salarial e demissões – tem incendiado a Europa. As manifestações massivas têm caráter reativo à privatização do sistema de saúde e se soma à atuação dos jovens, que amargam o maior desemprego da história ibérica nas últimas décadas, mas isso não se traduziu nas urnas. O povo grego continua sua admirável luta, mas as medidas recessivas e espoliativas preconizadas pelo Banco Central Europeu têm sido implementadas, a ferro e fogo. Por outro lado, não podemos fechar os olhos à ascensão fascista, especialmente expressiva na Grécia.

11. O Movimento Cinco Estrelas, de Beppe Grillo, na Itália, expressão da antipolítica, recebeu forte votação dos que, como nós, repudiam o sistema. Mas seu desdobramento é uma incógnita e revela muitas contradições. A crise é tão grande e generalizada que chegou ao Vaticano, com o primeiro Papa renunciante em quase seis séculos, denunciando a ‘hipocrisia religiosa’, revelando a profunda degradação das estruturas do poder eclesiástico, que interage com os poderes seculares.

12. Na dialética da Modernidade vivemos uma era de incertezas. Reconhecê-las, inclusive no âmbito das esquerdas, é tão importante quanto não ficar paralisado por elas.

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