quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Morre o filosofo marxista Leandro Konder: o PSOL e os socialistas perdem mais um ilustre militante!

“O século 20 foi um período terrível porque nos ensinou que as pessoas se apegam facilmente em certezas”. 
...Leandro Konder

Por Elson de Melo* - Faleceu na tarde dessa quarta feira (12/11/2014) o Filosofo marxista e militante do PSOL Leandro Konder. O PSOL e a esquerda socialista perdem um grande militante! Estudioso do marxismo Leandro Konder dedicou a vida em estudar e elaborar teses e ideias para libertar a classe trabalhadora do jugo dos capitalistas. Para ele, a causa socialista não está destruída. O socialismo precisa superar as derrotas sofridas, ver o que está vivo e o que está morto e seguir em frente. O filósofo marxista afirmou que faltou um certo jogo de cintura aos socialistas que participaram das primeiras experiências do século XX, como ter em mente que é preciso motivar as pessoas para que elas queiram participar.

“Leandro Konder nasceu em 1936, em Petrópolis (RJ), filho de Valério Konder, médico sanitarista e líder comunista. Formado em Direito, Leandro exilou-se em 1972, após ser preso e torturado pelo regime militar, e morou na Alemanha e depois na França até seu regresso ao Brasil em 1978. Doutorou-se em Filosofia em 1987 no Instituto de Filosofia e Ciências Sociais da UFRJ. É professor do Departamento de Educação da PUC-RJ e do Departamento de História da UFF. Com vasta produção como conferencista, articulista de jornais, ensaísta e ficcionista. Em 2002 foi eleito o Intelectual do Ano pelo Fórum do Rio de Janeiro, da UERJ. Um dos maiores estudiosos do marxismo no país, coordenou, em conjunto com Michael Löwy, a coleção Marxismo e literatura, da Boitempo.

Konder sofria de Mal de Parkinson há muitos anos e veio a falecer em casa em 12 de novembro. O velório será no Cemitério Memorial do Carmo a partir das 15h da quinta-feira 13 de novembro.” (fonte: Boitempo)

Descanse em paz camarada! In’ memoriam ao grande lutador Leandro Konder, transcrevemos abaixo um texto que ele produziu para o PSOL confira...

Teoria para o PSOL
Leandro Konder

Um velho amigo meu, que sabia grego antigo, me disse uma vez que a palavra “teoria” vinha do grego, theoro, que significava “eu vejo”. Como nunca verifiquei essa etimologia, tenho a impressão de que, ao usá-la, estou sendo um pouco aventureiro.

Apesar disso, na abordagem do tema, ao tentar responder à pergunta “o que é teoria?“, não fui capaz de resistir à tentação de recorrer à etimologia que o meu amigo me ensinou, mesmo suspeitando que ela seja fantasiosa.

No nosso trabalho e na nossa atividade política, vez por outra aparecem idéias que não estão provadas, mas são verossímeis. O que se poderia objetar a essa hipótese implícita na origem da palavra “teoria”?

 Os acertos da teoria dependem do acerto fundamental com que ela se situa no nível que lhe é mais adequado, isto é, no nível em que estão formuladas as demandas que ela é desafiada a atender.

Os conceitos e as imagens mais abstratos que nós podemos conceber são filosóficos. Quem perguntar quem somos nós, de onde viemos, para onde vamos, estará sem dúvida fazendo filosofia (ou se divertindo à custa dos filósofos).

Entre nós, nas lutas da esquerda, houve, no passado, momentos nos quais transparecia, nitidamente, certa desconfiança na teoria, certa suspeita no recurso (abusivo?) de argumentos “cerrados”, que podiam “intimidar“ o interlocutor.

Alguns ativistas, militantes, exageravam no ”praticismo” e chegavam a se orgulhar de serem ignorantes. Eram, em geral, companheiros que desejavam sinceramente continuar a lutar. Creio que, embora mal formados no plano teórico – citavam os “clássicos” misturando os níveis de abstração das ideias citadas ― esses companheiros, movidos pela paixão revolucionária, contribuíram muito para o movimento dos trabalhadores e para o questionamento do domínio burguês, no Brasil.

Outra coisa: apesar de sua incompreensão da importância da teoria, esses bravos militantes alertavam os companheiros para o risco de uma superestimação da mesma, o que efetivamente ocorria em alguns ambientes.

Alguns conceitos filosóficos eram de difícil interpretação. O conceito de teoria deu um passo adiante, nesse momento, quando foi introduzido nos debates o conceito de práxis, que Karel Kosik¹ considerava o conceito mais importante do marxismo.

Na contraposição teoria x prática, como fica a práxis? Em princípio, ela se apóia no primado da ação. O próprio conhecimento humano nos remete ao nível decisivo da história que estamos fazendo (ou que “eles” estão fazendo contra nós).

A aproximação da práxis à prática é fruto de uma grave confusão. Não é qualquer prática que é práxis. As atividades mecânicas, a satisfação de necessidades fisiológicas – nada disso – é práxis.

Práxis é o nome dado às atividades em que a humanidade se realiza, o gênero humano se expande, os sujeitos fazem escolhas, tomam decisões e agem. Trata-se, portanto, de uma espécie de atividade que precisa da teoria, que depende de conhecimentos teóricos, de informações atualizadas. E depende também, a partir de um certo nível de complexidade, de construções filosóficas.

A experiência histórica dos brasileiros, nesse aspecto, não é tão rica como todos nós gostaríamos que fosse. Discutimos pouco e de maneira freqüentemente emocional. Tenho a impressão de que debatemos às vezes sobre questões irrelevantes. Aí, perdemos tempo.

É muito bom sabermos que estão circulando nas escolas superiores as construções filosóficas de Gramsci, de Lukács, de Adorno ou de Benjamin. É claro que esses magníficos pensadores marxistas não vão resolver os nossos problemas. Estamos muito distanciados deles, no espaço e no tempo.

 Para lidar com as construções filosóficas de grandes pensadores, porém, não podemos nos limitar a agregar os pensamentos deles aos nossos. Devemos aproveitar as idéias dos gigantes pensando por conta própria. Dialogando com eles. Sem subserviência, mas com muito respeito.

Nosso companheiro Carlos Nelson Coutinho vem realizando, através do estudo das obras de Gramsci, um trabalho exemplar, como tradutor e também como crítico.

Por um lado, uma boa fundamentação teórica só pode resultar de muito esforço, de muita perseverança (e uma forte consciência de que nenhuma teoria vale de maneira absoluta para todos os tempos).

Por outro lado, a tarefa se torna ainda mais dura, porque o conhecimento, dialeticamente, necessita de um atento e severo exame crítico dos problemas político-culturais que abarcam a nossa atuação num espaço mais amplo e menos restrito.

E Carlos Nelson Coutinho demonstra como, a partir da dialética do universal e do particular, o falecido Gramsci nos ajuda a pensar o Brasil e o Brasil nos ajuda a pensar Gramsci.

A elaboração da teoria política corresponde não só às exigências imediatas da luta de classes, mas também às necessidades dos conflitos menores, de interesses locais, e, para complicar ainda mais a cabeça dos combatentes, aos aspectos mais significativos, mais universais do processo histórico de autoconhecimento, de autodescoberta, de autoinvenção e de autolibertação da humanidade.

Há uma grande quantidade de jovens convergindo para o PSOL. Certamente na expectativa de encontrar no nosso partido um ambiente saudável para a teoria engajada, isto é, para a praxis.

Esses jovens nos trazem ricas potencialidades para superarmos os limites do nosso conhecimento ainda acentuadamente empírico. E que podem nos levar a uma praxis que nos permita dizer: theoro.


Leandro Konder é filósofo marxista

Confira o texto original aqui

Elson de Melo é Presidente do PSOL/AM

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