sábado, 4 de janeiro de 2014

"O passe livre é exequível", diz Randolfe Rodrigues, senador e pré-candidato à Presidência da República pelo PSOL

A ZH, parlamentar disse que reforma agrária e tarifa zero no transporte serão suas bandeiras 

Carlos Rollsing

Oposição ao PT, Randolfe se destaca pela retórica  e pelo perfil combatente
Foto: Fabio Rodrigues Pozzebom /Agência Brasil,divulgação
De atuação enérgica no Congresso, o senador Randolfe Rodrigues (PSOL-AP) já se mostrou capaz de causar incômodos ao governo. Oposição ao governo Dilma Rousseff, se destaca pela retórica e pelo perfil combatente.

Mas já causou polêmica em seu partido ao se aproximar do DEM nas eleições de 2012 para a prefeitura de Macapá, o que levou a ser rotulado como líder da “ala light” do PSOL.

Atento aos direitos humanos e às reivindicações populares, agora é candidato à Presidência, após ter derrotado a ex-deputada gaúcha Luciana Genro na pré-convenção da sigla. A ZH, indica que a reforma agrária e a tarifa zero no transporte, subsidiada por aumento de imposto, serão suas bandeiras.

Zero Hora — Quais serão os eixos da sua campanha?

Randolfe Rodrigues — Pensamos em uma campanha identificada com o que veio das ruas, com as reivindicações de junho. Existe uma pauta de direitos sendo clamada pelo povo. E isso não está sendo satisfeito pelos governos, especialmente o federal. As outras candidaturas colocadas (Dilma Rousseff, Aécio Neves e Eduardo Campos) se preocupam mais em agradar ao mercado, aos financiadores, do que atender os investimentos em saúde, educação, mobilidade e reforma agrária.

ZH — O PSOL, que esteve na origem de algumas manifestações, como no caso de Porto Alegre, tentará se apresentar como um dos propulsores dos movimentos de junho?

Randolfe — Ninguém pode ter a arrogância de se dizer titular das mobilizações. Ninguém pode se apoderar. Aqueles que acham que o mais importante são as obras monumentais da Copa, creio que não poderão falar em nome do que ocorreu no Brasil.

"As mobilizações de junho foram muito maiores do que qualquer partido. Na campanha presidencial, vamos ver quem terá legitimidade para falar" — Randolfe Rodrigues.

ZH — O senhor apresentará propostas reivindicadas nas manifestações, como transporte gratuito?

Randolfe — O passe livre é exequível. O problema é que a presidenta disse que queria dialogar com as manifestações e, depois, esqueceu. Qual é a lógica dessa proposta? Quem tem mais, paga aos que têm menos. É a proposta de inversão no IPTU. A União pode fazer isso? Não. Mas pode induzir a isso. Falei a presidenta que ela tinha de enfrentar a máfia do transporte coletivo.

ZH — Para adotar a tarifa zero, o senhor sugere aumento de IPTU?

Randolfe — Precisaria de uma política progressiva. Isso é uma medida adotada na Europa. Os locais da cidade de melhores condições aportam recursos para que quem tem menos condições possa ter transporte coletivo.

ZH — Como avalia os movimentos de Eduardo Campos e Marina Silva, que se apresentam como novidade em uma terceira via?  

Randolfe — O Eduardo, com todo o respeito, não é o novo. O partido do Eduardo está na política desde 1946. O avô (Miguel Arraes) representa um setor da política que existe desde a época da ditadura. O Eduardo e o PSB estiveram na coalizão que governa o país. Ele poderia ter feito essa ruptura com o governo (Dilma) há mais tempo. A maior parte do partido dele está com o agronegócio, votou contra o código florestal no Congresso.

"A Marina, se refletisse um pouco mais, deveria votar na gente, votar em mim. Eu que estive no Congresso defendendo um código florestal verdadeiro. O novo nessa eleição é o PSOL" — Randolfe Rodrigues.

ZH — O PSOL, por vezes, é apontado como partido que quebraria a economia justamente pelo discurso radical contra setores que representam importante fatia do PIB, como o agronegócio. Como avalia?

Randolfe — Essa turma leva o Brasil a estar há 20 anos sob a maior taxa de juros do planeta, as famílias a serem as mais endividadas da America Latina. A taxa de juro está nos levando a reprimarização da economia. Temos uma pauta de exportações que é a mesma dos anos 1960. Estamos nos transformando em uma enorme fazenda de soja em vez de sermos potência industrializada. E somos nós que vamos transformar o Brasil em um país economicamente ingovernável? São eles que estão fazendo isso. Queremos que o país volte a ser um exportador de produtos manufaturados.

ZH — Para enfrentar a inflação, qual seria o remédio adequado?

Randolfe — Primeiro, baixar os juros. Outro mecanismo é fazer a reforma agrária. Parte da inflação é causada pelo preço dos alimentos. Não podemos ser o país do latifúndio. O produto tem de chegar à mesa sem especulação. A América toda já fez a reforma agrária. Só aqui neste país que não foi feito. Só o presidente gaúcho chamado João Goulart teve coragem de anunciar. E por isso foi golpeado. Tem de ter a coragem do Jango, que disse que os latifúndios improdutivos à beira de estrada estavam desapropriados.

ZH — A sua reforma agrária seria com pagamento de indenização?

Randolfe — Vou cumprir o que está na Constituição, que reza claramente: a terra tem de cumprir seu papel social.

ZH — Como avalia o conflito entre índios e pequenos agricultores pela demarcação de terras?

Randolfe — Enquanto o governo não olhar a questão indígena com a prioridade que merece, o conflito vai existir. O governo tenta acender uma vela a dois senhores. Não se serve a dois senhores. Eles (índios) são senhores de direitos e não coitadinhos aos quais se concedem favores.

ZH — O senhor tem atuado com o senador Pedro Simon (PMDB-RS), sobretudo no projeto que anulou a sessão que derrubou Jango. Como tem sido essa convivência?

Randolfe — Simon é farol que me ilumina. Inspira desde o meu pai, que se espelhava na atuação dele como deputado no RS. Quando cheguei ao Congresso, tive a honra de ter o voto do Simon como candidato à Presidência do Senado contra José Sarney (PMDB-AP). Construímos uma relação. Uma das coisas que vou ter o prazer de contar aos netos é sobre a convivência com Simon.

ZH — O senhor recebeu duras críticas, inclusive no PSOL, porque o seu candidato à prefeitura de Macapá teve, em 2012, apoio do DEM no segundo turno. Admite que houve incoerência?

Randolfe — Não existiu apoio do DEM a nossa candidatura. Existiu o apoio do candidato a prefeito do DEM (que foi derrotado no primeiro turno) ao nosso candidato, no segundo turno. O DEM, enquanto partido, esteve no palanque do adversário. São descolamentos das pessoas para apoiar personalidades de esquerda. Não existiu apoio do DEM. Quero deixar claro.

ZH — A Luciana Genro será candidata a vice na sua chapa?

Randolfe — Quero unir o PSOL e a esquerda. Lamentavelmente, a Luciana não é mais deputada. Vou ficar muito feliz se tiver competência política para construir a chapa com ela. Seria o melhor ao partido e à esquerda. E vamos conversar com PSTU e PCB.

ZH — Qual será o seu posicionamento diante da Copa no Brasil?

Randolfe — Vou torcer para o Brasil, mas vou questionar muito os investimentos. Como pode ter capacidade para fazer estádios monumentais em tão pouco tempo? Também devemos ter a mesma capacidade para fazer em educação, saúde e mobilidade urbana. É isso que reclama o povo. E quero questionar outras coisas, como a facilidade que prestamos a entidades suspeitas como FIFA e CBF. Acho inaceitável. O governo apoia a CBF.

"Como pode ter capacidade para fazer estádios monumentais em tão pouco tempo? Também devemos ter a mesma capacidade para fazer em educação, saúde e mobilidade urbana" — Randolfe Rodrigues.

ZH — O senhor crê que a Copa organizará nova agenda de protestos? Poderá impactar nas eleições?

Randolfe — Torço pela capacidade de mobilização do povo sempre. Só uma sociedade mobilizada por direitos é que pode construir um país melhor. A Copa pode ser um catalizador de mobilizações, sim, mas a sociedade precisa se mobilizar pelos direitos que não estão sendo garantidos.


Fonte: ZERO HORA

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